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11 dezembro 2014

O Paraíso é Aqui



Sem dúvida alguma, um dos maiores fenômenos da tecnologia nos últimos anos são as chamadas redes sociais. Elas nos oferecem interação em tempo real com uma comunidade de pessoas, muitas das quais conhecemos intimamente, outras nem tanto, além de permitir que fatos e circunstâncias de nossas vidas possam ser vistos e comentados por terceiros.
Uma dessas redes sociais, que tem por objetivo promover diversão, criou um produto que permite que residentes do universo online possam viver uma vida paralela. Nele é possível trabalhar, estudar, passear, namorar, fazer compras, vender, ter novos amigos, viajar, ou seja, experimentar quase todas as dinâmicas de uma vida real.
Contudo, para os usuários do programa, a maior vantagem do metaverso tridimensional é que você pode ser quem quiser, ter uma outra vida, um alter ego, ser totalmente diferente de quem na verdade é! Nele você pode ser famoso, rico, bonito, saudável, bem empregado, ou seja, ter ou ser tudo o que você sempre quis, mas que, talvez, nunca tenha conseguido.
Sociologicamente falando, é curioso perceber esse fenômeno da contemporaneidade que está presente nas redes sociais. Nelas é mesmo possível ter uma vida dentro da própria vida, pois o ambiente virtual permite que qualquer um seja e se apresente da forma como bem desejar! Na verdade, a grande maioria das pessoas está ali se relacionando com outras tantas que nem sequer lhe conhecem bem, ou mesmo que nunca lhe viram pessoalmente.
Eu sou usuário de uma dessas redes. Entro lá para divulgar mensagens, artigos, reflexões, frases e pensamentos. Como não tenho tempo para ficar analisando o que se posta, às vezes dou uma olhada rápida no feed de notícias para ver o que aparece por lá... É como se você ficasse diante de um grande mural onde as pessoas postam as mais diversas informações: textos, músicas, imagens, vídeos, piadas, e tudo o que, eventualmente, lhes chama a atenção.
Obviamente, o material publicado pelas pessoas muda de acordo com os conteúdos interiores que em cada um existe, com sua matriz de valores. Como somos uma geração com muita aparência e pouca consciência, tenho percebido que, cada vez mais, encontro coisas inapropriadas e desagradáveis. Recentemente, inclusive, cheguei a afirmar que esse “ambiente” estava parecendo um grande lixão, onde é preciso um esforço hercúleo para encontrar algo que se aproveite.
Mas o que mais me impressiona nas redes sociais é o fato de que boa parte das pessoas vive, na grande maioria do tempo, uma enorme mentira, pois estão mergulhadas numa vida que não lhes pertence. É gente que está despedaçada fazendo piada, casais em crise postando fotos de amor, profissionais frustrados contando vantagens, pessoas solitárias compartilhando experiências maravilhosas, pais descuidados em fotos belíssimas com os filhos, gente flertando e contando lorota, etc.
Em resumo, é muita encenação e pouca verdade! O grande perigo de tudo isso é descuidar nos exageros e cair no que bem citou o escritor Millôr Fernandes: “Jamais diga uma mentira que não possa provar”.
Triste geração esta, onde ser o que se é tornou-se algo insuportável. Por isso, precisamos tanto do disfarce, de algo que nos projete da falsidade real para a realidade virtual. Tem toda a razão Erich Fromm, psicanalista alemão, quando afirmou: “Somos uma sociedade de pessoas com notória infelicidade: solidão, ansiedade, depressão, dependência; pessoas que ficam felizes quando matam o tempo que foi tão difícil conquistar”. E me responda, com total isenção e honestidade, em que lugar se “mata” mais o tempo do que nas redes sociais?
Diante de tudo isso, alguém pode afirmar que sou contra a tecnologia. Não, não sou. Mas, confesso: sou totalmente cético quanto ao fato de que a tecnologia pode nos tornar pessoas melhores e dar à humanidade um futuro mais tranquilo. E aqui lembro de George Carlim, escritor norte-americano, que afirma: “Construímos mais computadores para armazenar mais informação, produzir mais cópias do que nunca, mas nos comunicamos menos”.
Escrevi esse texto porque estive conversando com uma pessoa que conheço há bastante tempo – alguém que não pode me esconder os contornos de sua vida – e percebi que seu estado era preocupante. Sim, senti suas dores, discerni sua angústia, “inalei” sua tristeza, “sorvi” sua solidão, “degustei” sua ansiedade, seus medos, sua aflição . Foi um diálogo longo e difícil...
Todavia, na manhã posterior a essa nossa conversa, quando fui divulgar algo nas tais redes sociais, percebi que o dito cujo havia postado piadas e fotos engraçadas, contando vantagens e falando bobagens, como se nada do que está “depositado” nas gavetas do armário de sua alma fosse real.
Diante do ridículo da situação, e com certo ar de decepção, não me restou outra alternativa a não ser relacionar tudo aquilo com a velha canção do Bee Gees – “ Jive Talking ” – cujo título, numa tradução livre, pode ser compreendido como: “Papo Furado”. Sim, meu “mano”, tudo aquilo que foi publicado não passou de conversa mole, dissimulação e mentira.
Por isso, tenha muito cuidado ao navegar pelas redes sociais, pois, do outro lado da linha, tem gente de carne e osso – e não estátuas! Certo mesmo estava cantor e compositor Renato Russo ao afirmar: “Mentir pra si mesmo é sempre a pior mentira”. E viva o ciberespaço!

Carlos Moreira


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