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Jesus dizia a todos: "Se alguém quiser acompanhar-me, negue-se a si mesmo, tome diariamente a sua cruz e siga-me. Lucas 9:23.

25 maio 2012

Os “Brutos” Também Choram




Ainda hoje eu me perturbo quando penso no sepultamento de meu pai. Só sabe o que é isso quem já enterrou alguém querido na vida. Das muitas lembranças, todas muito doídas, uma me atormentou até bem pouco tempo atrás: o fato de não ter conseguido derramar uma única lágrima em seu funeral.

Quando você perde alguém que ama, sempre acha que poderia ou deveria ter feito algo a mais. Essa sensação de culpa, não raro, faz as pessoas adoecerem. Comigo não foi diferente. Filho único, vi meu pai ser vitimado pelo câncer em 2006, três meses após detectar a doença. Racionalmente, sabia que havia feito o possível, o que estava ao meu alcance. Mas, inconscientemente, carregava culpas infundadas, punia-me por não ter realizado o impossível: salvá-lo.

Quem me viu no enterro, naquela manhã de segunda-feira, se não me conhecia bem, provavelmente achou que eu não estava sentindo absolutamente nada. Minha expressão era serena, apesar de circunspecta, a voz projetava-se suave, agradecendo a solidariedade de parentes e amigos, não havia lágrimas em meus olhos, nem desespero em minha face. Era meu pai quem estava ali, morto, no caixão, mas sei que, para muitos, parecia um qualquer dos tantos que, como pastor, já enterrei.

Passados alguns meses, processadas as dores, vivenciado o luto, tomadas todas as resoluções inerentes a um falecido, eu enfim, “descansei”. E foi justamente aí que os problemas começaram... Três meses haviam se passado quando meu corpo resolveu “falar”, tomou uma decisão unilateral de expelir tudo àquilo que minha alma guardara só para si, aprisionara nos escaninhos mais profundos do meu ser.

Eu sentia dores no corpo, no abdômen, nas costas, sentia palpitações no coração, falta de ar, pressão no peito, compressão na alma, desespero e medo. Algumas vezes, de tanta agonia, fui até o hospital, mas quando examinado, não possuía nada. Fiz check-up, tudo quanto foi tipo de exame, nada, absolutamente, nada!

Durante quase toda a vida havia sido uma pessoa trancada, travada. Hoje consegui as explicações para alguns comportamentos, desde um temperamento recluso, tímido, até uma criação super-protetora, asfixiante. Mas até descobrir estas coisas, precisei “cavar” fundo até chegar ao interior do ser, embarquei para dentro de mim mesmo em busca de quem eu sou, decidido a me encontrar de qualquer maneira.

Muito aos poucos, como alguém que está tateando no escuro, comecei a liberar algumas emoções, antes reclusas. Era como se tivesse tomado o controle que o ego exercia sobre minha consciência e entregue ao “Id”, que “habita”, grosso modo, o meu inconsciente, aqui me referindo aos conceitos da teoria psicanalítica de Freud.

O que posso dizer hoje, passados alguns anos, é que alterações profundas aconteceram e ainda continuam acontecendo em minha alma. Desde que comecei a me abrir para a vida, a ser mais sensível, alternando em meu ser a sensibilidade do poeta com o pragmatismo do profeta, passei a perceber a existência por outros matizes, aprendi que chorar faz bem, por isso as Escrituras afirmam que o caminhar humano deve ser regado por lágrimas, pois elas se tornam sementes de esperança sob o solo empoeirado da vida.

O melhor, todavia, ainda estava por vir... No ano passado, no dia dos pais, resolvi fazer uma singela homenagem ao meu “velho” no blog. Escrevi um punhado de palavras, duas dúzias, e coloquei o vídeo do Fábio Júnior cantando a canção “Pai”. Montei tudo no blogger, publiquei, e fui escutar. Estava no meu escritório, no apartamento onde moro, e era tarde da noite, horário que normalmente escrevo.

De repente, como um vulcão em erupção que “cospe” larvas as alturas, comecei a chorar. Lembrava do meu pai, dos momentos bons que vivemos, dos momentos difíceis e tristes, era um caldeirão de emoções com meus sentimentos “borbulhando” dentro de mim, e eu ali, absorto, na solidão daquela noite inesquecível. Sim, eu chorei intensamente, anos depois de sua morte, tudo o que não havia chorado no dia de seu enterro. Deus sabe o quanto aquilo foi libertador para mim, quanta alegria eu tive em chorar daquele jeito.  

Eu creio firmemente que um dos maiores desafios do Espírito Santo é reconstruir nosso interior, o qual, não raro, foi “ferido” de muitas maneiras diferentes pela vida. Por conta disto, acabamos nos monstrificando, nos tornando seres de aço, nos esquecendo que somos, simplesmente, pó e osso. Hoje acredito que a vida só pode ser vivida na sua singularidade maior se pudermos sentir todas as emoções que cada momento nos reserva e nos remete. 

Por isso Jesus me fascina tanto, pois ele encarna o verdadeiro Homem, expondo-nos todas as suas dimensões e revelando-nos todas as suas emoções. Sim, o Galileu chorava, se alegrava, falava contundentemente e se calava de forma inquietante. Nunca se furtou de experimentar nem a doçura nem o amargor, nem a ternura nem a dor, fazia tudo com intensidade, por isso era Totalmente Homem e Totalmente Deus. De fato, como diz karl Barth, ele era mesmo o “Totalmente Outro”. 

Carlos Moreira

 

Alma de Lata, Coração de Pedra e Nervos de Aço




Eu fui me desumanizando aos poucos, num processo lento, imperceptível. A transformação de um ser humano em máquina é uma das grandes maravilhas da sociedade contemporânea. É quase inacreditável, mas, quando você se dá conta, seus sentimentos já se embotaram, sua alma ficou árida, ácida, sua sensibilidade exilou nas cavernas sombrias do ser, seu coração tornou impermeável. Como diz a canção nostálgica do Pink Floyd: “agora você está confortavelmente anestesiado”.

Eu não sei como tudo começou... Talvez ainda bem cedo, na adolescência, quando me apaixonei pela informática. Alan Turing, cientista britânico com especialização em tecnologia, disse certa vez: “As máquinas me surpreendem com muita frequência”.

Nos últimos 25 anos tenho trabalhado com computadores desenvolvendo sistemas. Durante boa parte desse tempo, convivi mais com eles do que com gente e, assim, acabaram tornando-se tão íntimos que nós até conversávamos. Era possível demonstrar raiva, frustração, alegria e outros sentimentos que, quando eu era humano, sentia...

Nessa mesma época eu tive contato com a “religião”. Minha experiência de “conversão” mudou minha forma de agir, mas não minha maneira de pensar. Talvez esse tenha sido o maior de todos os problemas, eu me tornei “mestre em Israel”, mas minha alma estava esvaziada de valores como a misericórdia, o perdão, a humildade e o amor. Meu lado máquina, movido pela letra que mata, me converteu num soldado lutando pela causa da Igreja, mas eu ainda não podia perceber o quão estava distante de Jesus de Nazaré e do Evangelho.

É difícil admitir, mas, em pouco tempo, havia me tornado um workaholic espiritual, um jovem viciado em realizar, pois tudo era urgente e o mundo estava perdido! Minha agenda surpreendia até líderes religiosos: eu evangelizava nos hospitais, cantava nas praças, pregava nas ruas, me reunia com pequenos grupos, participava de cultos, vigílias e reuniões de oração. Ia à escola dominical e me envolvia com movimentos de todo tipo da minha comunidade e de outras. Lia compulsivamente as Escrituras, livros devocionais e comentários bíblicos. Ouvia mensagens pela TV e em fita cassete. Eu não parava, não descansava. No meu idealismo pragmático, estava investindo tudo no Reino, acumulando galardão e servindo ao Senhor!

Hoje, olhando para trás, vejo que tudo aquilo foi feito por mim e para mim, não para Deus. Ao largo de tudo aquilo estava Jesus; nós andávamos no mesmo caminho, mas, caminhando de maneira totalmente diferente. Não creio que Ele tenha desprezado a minha alma, pois eu me desencontrara de mim mesmo, mas enfim fui achado, “estava morto e revivi...”, parafraseando a parábola do filho pródigo.

Sei que demorou muito até eu perceber, pois a máquina estava programada apenas para cumprir. Não havia comando para pensar ou para falar, ainda que eu nada ouvisse; ou para ler, mesmo que sem poder discernir; ou para trabalhar, embora desprovido de amor.

Eu acordei quando me voltei para as Escrituras: “pois eu tive fome, e vocês me deram de comer; tive sede, e vocês me deram de beber; fui estrangeiro, e vocês me acolheram; necessitei de roupas, e vocês me vestiram; estive enfermo, e vocês cuidaram de mim; estive preso, e vocês me visitaram”. Mt. 25:35-36.

Sim, na minha religião só havia Deus e eu. Não existia o outro e, sem o outro, não há como amar a Deus, pois, se não amo aquele a quem vejo, como poderei amar a Deus, a quem não posso enxergar?!

Eu já estive muito ocupado com a “obra de Deus”, mas, há alguns anos, isso mudou. Percebi que havia me embrutecido, me tornado amargo, implacável. De fato possuía um currículo com muitas realizações, era difícil algo me desafiar, mexer comigo. Mas da mesma forma como eu me perdi de mim mesmo, Deus foi me trazendo de volta, resgatando-me para que eu pudesse ser aquilo para o que fui concebido, e não aquilo que a religião havia feito de mim.

Como o “Pródigo”, eu havia chegado ao fim do trilho, no fundo do poço. Tinha subido institucional-mente, mas minha alma beirava o inferno, sofria com a solidão, revolvia-me em agonias e inquietações, padecia de calafrios ao meio-dia.

Eu era a antítese daquilo que havia sido chamado para encarnar, havia me transformado num “RoboCop da Fé”. Sobraram de mim mesmo apenas os vestígios de um homem, minha alma era de lata, meu coração de pedra e meus nervos de aço.

A “viagem” de volta foi insólita... Eu andei pelo vale da sombra da morte; tinha todos os sintomas de quem estava sucumbindo, ainda que os médicos e os exames atestassem que minha saúde era boa. Olhava-me e não reconhecia o que via, estava exausto aos 40 anos, havia feito tantas coisas e, ainda assim, sentia como se nunca tivesse feito nada, tornara-me um escravo da performance, neurotizado com metas e números.

“Nos próximos anos, todavia, eu irei me dedicar mais a Deus, por isso, trabalharei bem menos para Ele” foi uma citação de um texto da época. A duras penas aprendi que o que Jesus deseja é muito diferente daquilo que eu estava fazendo. O Evangelho é simples, mas, como diz o sábio, “o simples é o contrário do fácil”.

Eis, então, o que busco agora: “...o jejum que desejo não é este: soltar as correntes da injustiça, desatar as cordas do jugo, pôr em liberdade os oprimi-dos e romper todo jugo? Não é partilhar sua comida com o faminto, abrigar o pobre desamparado, vestir o nu que você encontrou, e não recusar ajuda ao próximo? Aí sim, a sua luz irromperá como a alvora-da, e prontamente surgirá a sua cura; a sua retidão irá adiante de você, e a glória do Senhor estará na sua retaguarda...”. Is. 58:6-8.



Carlos Moreira


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