Eu não acredito que ninguém possa conhecer a Deus, através de Jesus e do Evangelho, e ainda assim se tornar uma figura retórica, apática, expressando uma espiritualidade tão etérea que não dura para além do culto de domingo.
Conversão, para mim, é visceralidade, é uma experiência de uma violência tal, que as marcas ficam tatuadas na alma, há uma mudança no olhar, no falar e no sentir, o indivíduo nunca mais será o mesmo, algo avassalador lhe revolve as entranhas, um outro ser, cresce dentro de si, pede licença para vir a superfície dos dias, esmaga e consome a velha natureza.
Eu olho para esta geração, para as catedrais lotadas, para os 60 milhões de evangélicos e os 140 milhões de católicos no Brasil, e o que vejo é apatia, é superficialidade, é gente que não tem um centro de gravidade espiritual, nem um caráter modificado, nem gestos largos, nem cicatrizes que marcam a vida.
Na verdade, somos a geração dos crentes de plástico, gente sem alma, sem emoção, sem paixão ou zelo pelas coisas do Reino, sem espírito sacrificial ou compaixão, sem solidariedade. Amontoamos saber teológico, e carecemos de ações de misericórdia, decoramos catecismos e confissões, e nada sabemos da prática da fé expressa na troca com o outro, decoramos versículos bíblicos, e esquecemos as lições elementares de Jesus no Sermão do Monte, somos os reis da retórica e da falácia, mas estamos esvaziados de obras que referenciem a experiência de fé.
Lucas, em seu evangelho, nos fala de Jesus visitando a casa de um fariseu chamado Simão. Na narrativa do cronista, o anfitrião, devidamente acomodado, foi surpreendido pela entrada em cena de uma “Mulher da Vida”. Ela não havia sido convidada, jamais poderia estar ali, mas quebrou todo o protocolo e correu todos os riscos para estar com Jesus.
Diz o texto: “Em seguida, virou-se para a mulher e disse a Simão: "Vê esta mulher? Entrei em sua casa, mas você não me deu água para lavar os pés; ela, porém, molhou os meus pés com as suas lágrimas e os enxugou com os seus cabelos. Você não me saudou com um beijo, mas esta mulher, desde que entrei aqui, não parou de beijar os meus pés. Você não ungiu a minha cabeça com óleo, mas ela derramou perfume nos meus pés. Portanto, eu lhe digo, os muitos pecados dela lhe foram perdoados, pelo que ela amou muito. Mas aquele a quem pouco foi perdoado, pouco ama". Lucas 7:44-47.
A conclusão é de uma obviedade flagrante: quem foi perdoado, quem nasceu de novo, quem foi regenerado pelo Espírito, quem teve a consciência ressignificada, quem sofreu a violência gentil da mudança de natureza, quem experimentou ter o coração de pedra transformado em carne, ama, e o amor cancela todos os pecados cometidos no chão da vida. O resto é etiqueta religiosa, é receber a Jesus sem dar-lhe a importância devida, é seguir prescrições, mas sendo esvaziado de todos os significados mais profundos da fé.
Sim, a lição de Jesus é tão clara, mas apenas aqueles que são como crianças é que poderão entender. O Nazareno não disse que era preciso frequentar templos, nem decorar textos, nem dar dízimos e cumprir liturgias, ele não fala de sacrifícios, de manuais comportamentais, nem de lutas frenéticas contra o diabo, apenas disse que quem ama, está perdoado, e João complementa: “Quem ama, conhece a Deus!”.
Eu não quero andar com “teólogos”, nem com “apóstolos”, nem com os big shots da religião, não quero mais me ocupar de discussões doutrinárias, ou de projetos eclesiais, mega-eventos, marchas ou coisas semelhantes, eu estou em busca de encontrar pecadores que amam, gente que chora e se compadece das dores dos homens e da Terra, gente que me inspire a viver a fé e seguir, a suportar estes dias que são tão difíceis...
Carlos Moreira
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