O carnaval é a antítese do cristianismo. O
reinado de Momo inverte toda a lógica cristã e subverte a ordem das coisas
proposta pela igreja.
Enquanto o cristianismo louva o comedimento, o carnaval brinda o excesso. A frugalidade é o ensino cristão, a extrapolação é a tônica do carnaval.
Durante o carnaval não existe pecado e nem pecador. No carnaval “o homem é Deus”, criador, onipotente e sem limites, brindando à vida enquanto tilintam as taças cheias de prazeres.
O cristianismo prega a vida eterna, o carnaval a eternidade da vida (ainda que ela só dure quatro dias). Aquele olha para o céu, este se volta para a terra.
O carnaval subverte toda a ordem, o
cristianismo se esforça por mantê-la. O cristianismo é a norma, o carnaval a
reviravolta, o mundo de ponta-cabeça!
O cristianismo, platônico que é, exalta o
espírito e as idéias puras. O carnaval, por sua vez, nietzscheniano em sua
essência, dá ênfase a carne, ao dionisíaco e não ao apolíneo.
O carnaval é a festa do mutável, da transformação, das múltiplas faces expressas nas inúmeras fantasias. O cristianismo cultua o dogma, o imutável, o estático, a permanência.
O cristianismo é recolhimento e solidão, é retiro espiritual, é quietude monástica. O carnaval é multidão, é contato, é fusão de corpos e almas.
O carnaval é a festa daquilo que é concreto e palpável, enquanto o cristianismo honra o abstrato. O cristianismo gosta do que não vê, o carnaval se entorpece com o que toca.
Confesso que nem me empolgo demasiadamente com o carnaval e nem reverencio o cristianismo. O que eu gostaria mesmo de ver era um carnaval mais cristão e um cristianismo menos carnavalesco. Seria isso possível?
André Pessoa