No meio cristão é muito comum você ouvir a expressão “Esse é o meu ministério, a cruz que tenho que carregar”. Sim, para muitos, viver a fé é carregar pesos, é sofrimento, é amargor de espírito e fastio de alma.
Quando esse entendimento se torna o farol da consciência, todo caminho é de pedra e todo chão é terra rachada e seca.
Creia: eu não quero ser um “ministério” na vida de ninguém, não quero ser tolerado, não quero receber um amor “piedoso”, culpado, imposto. Eu não quero ser um “ministério”, não desejo ouvir palavras embaladas em meias verdades, não quero andar com quem me assassina todo dia no coração, que me censura com olhares velados e me despreza com abraços falsos e risos toscos. Não, me desculpe, eu não quero ser um “ministério” em sua vida, não desejo sua compaixão de ocasião, motivada por uma espiritualidade que se professa com arrogância, uma santidade que exclui, um sentimento de pertencimento a uma casta da qual só os “iluminados” podem fazer parte.
Assim, deixe-me longe de tudo isso, não me dispense, sequer, um minuto de atenção, como bem disse o Cazuza, “Estou farto da caridade de quem me detesta”, portanto, fique longe de mim se, por algum motivo, me tornei um saco de chumbo nas suas costas ou um azorrague rasgando a sua carne.
Que se acheguem a mim os impuros, os imperfeitos, os “desviados” da religião, gente que abraça com vigor, que senta em mesa de bar e dá risada dobrada, que liga nas noites frias e diz coisas que só os poetas embriagados são capazes de falar. Sim, quero ser o alvo de flechas de amor, quero ser transpassado pela solidariedade de quem sabe o que é lamber o chão da vida porque a queda se tornou inevitável, estou em busca de gente sem pedigree espiritual, mas com coração de carne, gente que não tenha a plástica religiosa e a performance do templo, aqueles que desprezam a homilética teológica que se tornou glacê para compor um discurso que congela até o sangue nas veias.
A verdade é que cansei dessa santidade feita de madeira de cedro, cansei de gente que não enverga, que fez da letra sagrada uma arma para matar o outro, que se sente bem em excluir e que ama os primeiros lugares na fila da indulgência e do cinismo. Quero andar com os profanos que se alegram com coisas simples, com os caídos que ainda sabem sorrir do nada, com os pecadores que despejam sentimentos que aquecem a gente em dias sombrios, com os desvalidos que sentam no meio fio quanto a noite chega, só para dizer “Eu estou por aqui...”.
Definitivamente, e me perdoe por tal, mas eu não quero ser um “ministério” na sua vida...
Carlos Moreira