“Não existe felicidade; o que existe são momentos felizes” – (Vinícius de Moraes). Concordo com o “poetinha”, mas em parte. Existe felicidade sim! Ela é feita, justamente, da soma de fragmentos da existência, não apenas de momentos bons, mas também dos ruins. É que felicidade, para nós ocidentais, que vivemos condicionados pelo capitalismo, vem se tornando, cada vez mais, algo que está associado ao “ter”, o qual, por sua vez, só pode ser experimentado, via de regra, quando se alcança o “sucesso” profissional e financeiro.
Ora, convenhamos, a felicidade não está atrelada ao fato de possuirmos coisas. Conheço pessoas ricas e profundamente infelizes. Ser feliz também não é existir num estado de euforia permanente, como se fosse possível só colher alegria no solo de cada dia. Pelo contrário, é entender que a vida acontece a partir de um movimento dialético – acertos e erros, conquistas e perdas, pranto e riso. A vida abundante, da qual Jesus fala, não é usufruída a partir da supressão do que não nos dá prazer, mas, pelo contrário, ela é a soma de tudo que constrói em nós um ser melhor. Se assim for, será possível perceber que mesmo o “dia mau” pode trazer coisas boas, pois Deus sempre “conspira” ao nosso favor para permitir que toda experiência produza bem para o coração, e paz e saúde, para a alma.
Mas quem não quer viver momentos felizes? Eles são como gotas de orvalho no alvorecer da manhã. Relembrá-los é como alimentar o espírito de gratidão. Assim foram alguns dias na minha vida, simplesmente, inesquecíveis. O dia do meu aniversário de 8 anos, aquele em que ganhei a primeira medalha no atletismo e o dia de início da vida profissional. O dia da compra do primeiro carro, o que passei no vestibular, aquele em que casei com Fabiana e o dia do nascimento de Gabriela. Sim, estes foram, verdadeiramente, dias maravilhosos...
Ops! Cadê o dia da minha conversão? Será possível que ele não esteja entre os “10 mais” da minha vida? Não! Até mesmo, porque ele, simplesmente, não existe. Foi isso que, recentemente, tentei explicar a uma pessoa que me fez a seguinte pergunta: “pastor, quando foi o dia da sua decisão por Cristo?”. Hoje, respondi. “Hoje?!”, disse ela. Sim, hoje; esse dia chamado hoje. Já faz 26 anos que eu tomo a mesma de-cisão, todos os dias. Hoje, foi a última vez que a tomei, logo cedo, quando levantei da cama.
Não vamos complicar... É certo que, para muitos, existe um dia “histórico” onde uma decisão foi tomada, uma data que foi fixada no calendário. Não há problema nisso, pelo contrário, é maravilhoso! Para mim, entretanto, esse dia nunca aconteceu, uma vez que minha conversão foi um processo e, para falar a verdade, ainda continua sendo, ou seja, continuo me convertendo ao Senhor a cada dia.
Quando penso sobre o tema, chego a conclusão de que nunca o vi como algo fixo, ou seja, relacionado a um evento único, um dia específico de decisão. Minha idéia sempre esteve associada a algo dinâmico, pois, como sabemos pelas Escrituras, a vida cristã possui um desenrolar próprio, ou seja, ela se “constrói” a partir de uma seqüência de acontecimentos, que são: a regeneração (eu fui salvo), a justificação (eu sou salvo), a santificação (eu estou sendo salvo) e a glorificação (eu serei salvo).
Ora, tudo isto só pode acontecer com significado para o ser se, a cada dia, continuarmos tomando a de-cisão que tomamos no primeiro dia. A vida daquele que ama a Deus é composta, apenas, pelo dia de hoje, esse dia no qual todos nós temos de renovar nossa de-cisão de seguir a Jesus, com as implicações e significados que há nisso. Hoje precisamos renovar nossa fé, esperança, amor e paciência. Hoje estaremos expostos a situações nas quais de-cisões serão necessárias; seremos tentados, provocados, humilhados, agredidos e desencorajados. Como iremos suportar todas essas coisas se não tivermos começado o dia com uma de-cisão firme e um propósito inabalável de fazer a vontade do Pai?
Aquele que está sendo subornado, terá de tomar a de-cisão de ser íntegro, não aceitando o suborno. Aquela que está sendo seduzida, terá de manter a de-cisão de continuar sendo fiel ao marido. Quem está sendo tentado a mentir, terá de valer-se da de-cisão que fez em optar sempre pela verdade. O que está prestes a explodir, num acesso de cólera e ira, terá de tomar a de-cisão de se deixar controlar pelo agir do Espírito. Todas essas coisas só serão possíveis se houver a de-cisão de seguir a Cristo no dia de hoje, independentemente do que aconteceu ontem, ou anteontem.
Preciso lhe dizer algo: a coisa mais importante que você possui é o dia de hoje. Amanhã, ainda não chegou e já é tarde para se viver o ontem. As maiores dores humanas são justamente fruto dos restos do ontem e dos medos do amanhã. Por isso, decida viver o hoje com sabedoria e graça. “Hoje, se ouvires a sua voz, não endureçais os vossos corações...”. Hb. 4:7. Tudo que Deus tem para nós é para hoje! A salvação, a cura, a libertação, o perdão, a paz, o amor e a misericórdia. Tudo, tudo mesmo, é para hoje!
Por isso, se desejamos usufruir destas dimensões espirituais, manifestas a partir das dinâmicas de cada dia, precisamos transformar a decisão que tomamos de seguir a Jesus, um dia, na de-cisão de continuar seguindo-o todos os dias, e isso conforme o Evangelho. Desta forma será possível discernir os Seus propósitos na existência e experimentar do Seu amor e poder na singularidade de cada dia.
Sola Gratia!
Carlos Moreira