Não me venha com tua mesmice, tuas críticas cruas que rasgam meu ser. Por vezes sinto tuas unhas se cravarem em minha carne como garras de aves de rapina, arrancam minha pele sem derramar uma gota de sangue. Sim, tu és cirúrgico demais, mesmo para mim...
Deveras, tens de compreender, tuas teorias me entediam e me dá cansaço essa complacência com o descaso. És daqueles que tudo realizam, mas sempre no mundo das ideias... platônico demais para o real. Portanto, deixe-me ser, e saias do caminho!
Queres que eu confesse? Sim, os pecados são to-dos meus, não estou disposto a dividi-los com ninguém. Desejo o teu desprezo e que nunca descubras o que escrevo. Evites escutar o que falo, pois sou ácido e ávido, corto que nem navalha! Como já sabes, adoro o preto, mas detesto o ócio.
Um dia, não queiras enganar-me, pensaste que já sabias tudo. Mas te vejo calado, quieto, inseguro. Espreitas por entre portas entreabertas, por onde a vida passa cálida. O que te peço? Que afastes de mim tua compaixão, pois jamais desejei obter a caridade de quem me detesta. Se perguntarem por mim? Diz que fui por aí... com um punhado de sonhos nas mãos e lágrimas requentadas por perdas ínfimas.
Queres me surpreender? Então conta segredos sobre coisas que eu ainda não saiba. Tira as velhas roupas dos cabides, esvazia o armário e faze uma faxina na alma. Revira tuas ideias ao avesso, deixa o hermético de lado, é démodé o traço perfeito. Não me traga mesmices, não me canse com tagarelices, pois tu sabes o quanto gosto de fotos coloridas, mas, o real, esse tem mesmo de ser branco e preto.
Eu tenho um problema e tu o conheces. Estou andando nessa estrada já faz algum tempo. Sei onde estão os atalhos, as curvas e ondulações. As paisagens, são sempre as mesmas, não importa de que lado do caminho você esteja, indo ou voltando, são todas iguais. Por isso, faço uma trilha só minha, onde não haja pegadas, corro riscos, sinto medo, vejo os contrastes, tiro os disfarces, piso no chão com pés descalços, deixo o ar entrar pelo corpo e arejar os cômodos do meu ser.
Ademais, no íntimo de cada um há moinhos abandonados, ruas desertas, velas apagadas e copos vazios. Pudesse teu olhar penetrar mais fundo, como luz que vaza a cortina de seda fina, roubando da penumbra teus disfarces, se te fosse possível ir ao âmago, adentrar lugares escondidos, verias que interiores são feitos de poesia e que, na melancolia do ser, há paixões recolhidas e pétalas em flor.
Se quiseres, dou-te um conselho: quando tiveres que cortar a carne, faça o serviço com faca amolada, pois há decisões na vida que são quais amputações, salvam o ser da desgraça, mas produzem um aleijão na alma. E mais... se tens de fazer, então não perca a hora! Faze logo hoje, depressa, agora! A gangrena da consciência é pior do que o enfarto do coração.
Eis que encontrei uma coisa terrível debaixo do sol: o cotidiano! Ele passa a existência sentado no muro das ponderações. Faz contas, analisa, constrói gráficos, faz cálculos, imprecisas ponderações. Mexe, remexe, vira, não chega a lugar algum.
Mas deixa estar... Feliz é quem já se estrepou numa estrada de barro batido, tomou prumo pra lida, rasgou a roupa que camuflava a imagem e o orgulho que vestia a hipocrisia. Isso sim, muda a gente!
Dor é coisa preciosa. Quando não mata o “cabra”, quebra o tédio de seguranças pasteurizadas. Feliz é quem sofre, quem acumula rugas no rosto e certezas no olhar. Sofrer é acalento de gente grande, faz a lágrima escorrer pelo canto do rosto e leva embora sonhos embebidos em esperanças póstumas.
Dá-me, então, minha porção de sofrimento, pois é calejando os pés nas pedras do caminho que poderei ir mais longe. Mas não me canse com melancolias nem me venhas com doçuras ou canduras.
Se quiseres me ajudar, traze um balde com a lama que escorreu pela calçada por onde a tristeza desfilou impoluta. Com ele, mais um pincel de pintor, colorirei a tela da vida, sem mazelas ou pieguices, tudo preto no branco, vívido e verdadeiro, tudo como tem que ser.
Houve um tempo em que eu era idealista... Depois, a realidade se enraizou até os ossos, entrou pelas veias, entranhou-se na alma. No meu mimetismo, sempre busquei camuflar as imperfeições, disfarçar antigas contradições.
Mas o tempo devora tudo, muda a essência, transforma a existência. Hoje, confesso, cansei de “caras e bocas”, da “estética”, da plástica social, dos traquejos, das políticas e dos manejos.
Na verdade, nunca fui bom nisso, e agora fiquei irreparável. Hoje só me interessa aquilo que é, o que vaza da alma em direção à vida, que borbulha do caldo das incongruências e medos e se espalha pela tapeçaria dos dias.
É que chega o tempo em que o belo é torto, penso e díspare. Farto de tanta perfeição, você para e suplica: dá-me um pouco de ilusão! Faze isso e te serei grato pelo resto de meus dias. Sim, dá-me essa tal ilusão, faze uma alquimia qualquer, ainda que no fundo, ela seja a mais pura realidade...
Eu tenho um problema e tu o conheces. Estou andando nessa estrada já faz algum tempo. Sei onde estão os atalhos, as curvas e ondulações. As paisagens, são sempre as mesmas, não importa de que lado do caminho você esteja, indo ou voltando, são todas iguais. Por isso, faço uma trilha só minha, onde não haja pegadas, corro riscos, sinto medo, vejo os contrastes, tiro os disfarces, piso no chão com pés descalços, deixo o ar entrar pelo corpo e arejar os cômodos do meu ser.
Ademais, no íntimo de cada um há moinhos abandonados, ruas desertas, velas apagadas e copos vazios. Pudesse teu olhar penetrar mais fundo, como luz que vaza a cortina de seda fina, roubando da penumbra teus disfarces, se te fosse possível ir ao âmago, adentrar lugares escondidos, verias que interiores são feitos de poesia e que, na melancolia do ser, há paixões recolhidas e pétalas em flor.
Se quiseres, dou-te um conselho: quando tiveres que cortar a carne, faça o serviço com faca amolada, pois há decisões na vida que são quais amputações, salvam o ser da desgraça, mas produzem um aleijão na alma. E mais... se tens de fazer, então não perca a hora! Faze logo hoje, depressa, agora! A gangrena da consciência é pior do que o enfarto do coração.
Eis que encontrei uma coisa terrível debaixo do sol: o cotidiano! Ele passa a existência sentado no muro das ponderações. Faz contas, analisa, constrói gráficos, faz cálculos, imprecisas ponderações. Mexe, remexe, vira, não chega a lugar algum.
Mas deixa estar... Feliz é quem já se estrepou numa estrada de barro batido, tomou prumo pra lida, rasgou a roupa que camuflava a imagem e o orgulho que vestia a hipocrisia. Isso sim, muda a gente!
Dor é coisa preciosa. Quando não mata o “cabra”, quebra o tédio de seguranças pasteurizadas. Feliz é quem sofre, quem acumula rugas no rosto e certezas no olhar. Sofrer é acalento de gente grande, faz a lágrima escorrer pelo canto do rosto e leva embora sonhos embebidos em esperanças póstumas.
Dá-me, então, minha porção de sofrimento, pois é calejando os pés nas pedras do caminho que poderei ir mais longe. Mas não me canse com melancolias nem me venhas com doçuras ou canduras.
Se quiseres me ajudar, traze um balde com a lama que escorreu pela calçada por onde a tristeza desfilou impoluta. Com ele, mais um pincel de pintor, colorirei a tela da vida, sem mazelas ou pieguices, tudo preto no branco, vívido e verdadeiro, tudo como tem que ser.
Houve um tempo em que eu era idealista... Depois, a realidade se enraizou até os ossos, entrou pelas veias, entranhou-se na alma. No meu mimetismo, sempre busquei camuflar as imperfeições, disfarçar antigas contradições.
Mas o tempo devora tudo, muda a essência, transforma a existência. Hoje, confesso, cansei de “caras e bocas”, da “estética”, da plástica social, dos traquejos, das políticas e dos manejos.
Na verdade, nunca fui bom nisso, e agora fiquei irreparável. Hoje só me interessa aquilo que é, o que vaza da alma em direção à vida, que borbulha do caldo das incongruências e medos e se espalha pela tapeçaria dos dias.
É que chega o tempo em que o belo é torto, penso e díspare. Farto de tanta perfeição, você para e suplica: dá-me um pouco de ilusão! Faze isso e te serei grato pelo resto de meus dias. Sim, dá-me essa tal ilusão, faze uma alquimia qualquer, ainda que no fundo, ela seja a mais pura realidade...
Carlos Moreira