A igreja tem uma preocupação exacerbada com pessoas possuídas por demônios, mas dá pouca, ou quase nenhuma atenção, aos variados tipos de possessão.
Sim, possuídos tem notoriedade garantida no show bis evangélico e, mais recentemente, até no catolicismo romano. Endemoninhados aparecem em horário nobre na TV, possuem culto só para eles (Desencapetamento Total), tem liturgia própria (rituais de exorcismo), e papel de destaque entre o povo, que se lambuza garantindo mídia ao espetáculo bizarro.
Entretanto, para quem conhece a fenomenologia por trás destes eventos, não há com o que se preocupar, pois a esmagadora maioria dos casos de possessão demoníaca não passam de manipulação emocional, baixa autoestima, sugestionamento inconsciente, histeria e fraude comportamental.
Na verdade, demônio que faz entrevista, responde a perguntas e espera o comercial da TV, só engana crente assombrado, pois nem criancinhas se prestam a dar atenção a tais performances.
Ser possuído fisicamente pelo diabo é o estágio último de um processo longo, que começa na mente, passa pelas emoções e chega à dimensão do físico. E é daí que surge toda minha preocupação.
Ora, o que mais percebo na igreja é gente sendo possuída, mesmo que essa possessão não tenha, ainda, chegado ao estágio da perda do controle das faculdades mentais e do domínio do corpo físico.
Há pessoas possuídas pelo “espírito dos pais”, pela ambiência familiar perversa, por abusos, humilhações, violências, inclusive sexual.
Há pessoas possuídas pelo “espírito do cônjuge”, gente que se tornou vítima de relações persecutórias, esmagadoras, manipulativas. Há mulheres, por exemplo, que sofrem violência sexual mesmo estando casadas, são expostas a pornografia, obrigadas a prática de swing, ou chantageadas por não possuir autonomia financeira.
Há gente possuída “pelo espírito da religião”, crentes que estão possessos de seus pastores sedutores, temendo tocar no “ungido”, submetendo-se a determinações absurdas, aceitando revelações enfatuadas, profecias fatalistas, maldições encomendadas. Outros tantos ficaram possessos do “espírito da denominação”, são os que abriram mão de sua autonomia, de suas agendas, tornaram-se funcionários do templo, servidores do altar, deixaram para trás profissão, estudos, família e amigos para servir a “obra”.
Tem gente na igreja possessa da luxúria, viciada em pornografia digital, gente presa ao “espírito do consumo”, endividada, fazendo transfusão de dinheiro entre contas com o agiota, sendo esmagada pelo cartão de crédito. Imaginar que as manifestações visíveis do diabo são as únicas que estão ocorrendo é de um reducionismo e de uma ingenuidade sem precedentes.
Assim, o diabo agradece toda a atenção dispensada e toda a mídia dedicada para os pseudo-possuídos, enquanto ele se banqueteia distribuindo, no varejo, possessões das mais diversas sobre as pessoas. Como tenho dito, e aqui reitero, o pior diabo é aquele que está sendo gestado dentro de você sem você, sequer, perceber.
Carlos Moreira
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