Jesus nos fala sobre um homem infeliz no Evangelho de Lucas. Ele não era nem mendigo, nem enfermo, não padecia dos males comuns que matam os mortais. O problema do sujeito era excessos... Sim, ele sofria de um mal quase incurável: tornara-se insaciável.
A parábola nos relata a história deste amaldiçoado, um homem
que tinha de um tudo, do bom e do melhor, mas sua alma não se saciava, era como
pia que bebe água de torneira quebrada. De noite, ela sussurrava baixinho em
seu ouvido: “é pouco, eu quero mais...”.
Aquele tinha sido um ano especial por demais... Os celeiros
estavam abastados, cheinhos até a boca, quase engasgados. E homem, em sua
cadeira de balanço, olhava o resultado do seu penoso trabalho debaixo do sol. Era
orgulho só! Dizia consigo mesmo: “Tudo isso fui eu que fiz”. Pitava o cigarro
de palha, no entardecer do dia, e soprava a fumaça como chaminé de fábrica.
Mas havia em seu interior uma queimação, uma danação danada.
Era comichão, dava tremelique e tudo o mais, suadez, cansaço e coriza. O homem
olhava aquele amontoado de trigo no paiol e endoidecia: “É pouco!”, dizia, “Podia
ter feito mais...”. Havia sobejos no campo, uma restinga de nada que se podia
dar ao povo daquele lugar faminto, mas o peste não podia perder nem gota de
suor.
Tenho observado a vida, apreciado um tipo de apetite que só
se sacia com a terra da sepultura. Há homens que possuem tudo e são miseráveis
de espírito, sim, são pobres, cegos e nus. Tristeza desgraçada é a alma não se
fartar com nada, nem com ódio nem com amor, nem com pódios nem com dor. É como a
garganta escancarada tentando beber a água do oceano inteiro, mas o mar todinho,
para esse tal, não passa apenas de uma poça.
“Construirei celeiros ainda maiores e guardarei neles as
minhas riquezas...”, afirmou o desenganado. E foi assim que desfez castelos,
derrubou cercas, quebrou telhas, picotou o piso, botou tudo no chão, de riba até embaixo. Depois, sentou-se no alpendre, fez contas, planos, levantou paredes,
alargou espaços, botou nova coberta e pintou tudo de encarnado, uma belezura
que dava gosto de ver...
E foi assim que se foi o verão, cheio de canseiras e
mesmices... Então descansou o desinfeliz! Com celeiros maiores, capazes de
armazenar ainda mais trigo, ele agora dava-se por satisfeito. Mas até quando? "Não
teria sido melhor fazer, pelo menos, um galpão a mais para eventualidades?", pensava. E se
revolvia de um lado para o outro...
“Louco”, disse Jesus! Tens celeiros lotados e uma alma
vazia. Possuis mais do que podes consumir e não tendo com quem repartir, de que te
adianta tanta prosperidade? A riqueza só traz proveito se puder ser
dividida. A produção de toda uma vida acaba apodrecendo nos celeiros do ser quando
o fruto colhido se torna entulho de coisas no coração.
Carlos Moreira
Carlos Moreira
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