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17 dezembro 2013

De que são Feitos os Homens?



Certa vez me fizeram acreditar que o homem havia sido feito do barro. Mas que nada! Eu sei que o homem veio da borracha. Ele nasce tão flexível, e que incrível, pode até retorcer-se. Não fosse de borracha, ainda nos primeiros anos, sucumbiria. Quedas frequentes, insistentes, o matariam sem constrangimentos. Sim, é de borracha, modela e se adapta, se constrói, põe-se de pé e diz: eu sou!

Os dias, todavia, com apetite insano, avançam, devoram as folhas dos calendários... E eis agora o homem! Passadas fartas em calçadas plácidas ele avança, lindo. Tudo é delícia quando se é jovem. Nesta estação o homem é de aço. Imagina ser inquebrável, invencível. Torna-se duro, impermeável a dor e ao amor. Pensa que é eterno, corre todos os riscos, risca rastros no chão da vida, faz mapas, corta mares, adentra infinitos. Mas tudo isso também passa...

Aí o homem se torna homem, se converte em vidro, fica mais refinado, translúcido, misterioso. Homem de vidro bem sabe dos seus limites, entende que pode facilmente se quebrar, cair e não mais ser. Sendo de vidro, reflete a luz, rouba cenas, mas aparece apenas, sem protagonizar, torna-se caleidoscópio, sintetiza cores, faz desenhos no imaginário. O homem de vidro domina pensamentos, controla sentimentos, rebusca grifos nas páginas do livro dos seus dias, une letras que namoram palavras, palavras que acabam parindo frases e textos.  Fica o dito e tudo o mais escrito, quase eterno, quase...

Vem então o fim, apressado, fora de tempo. O homem sabe que sua beleza já se foi e que as certezas se perderam quais folhas de outono dançando na porta do terraço vazio. Em seu epílogo entre os viventes, o homem se torna de barro. Mesmo em sua aparente fragilidade, o barro possui lindeza por demais. Pode ser moldado, refeito, reinventado. Homem de barro sabe que a vida é silêncio e solidão, é manufatura diária para, ao final do dia, os pés poderem descansar de tantas andanças, de tanto lamento.


Na velhice o homem é de barro, sim senhor, vai se esfarelando pelo caminho, deixando partes de si no solo como semeadura da vida, é, ao mesmo tempo, semente e adubo. E só aí, quando homem e terra começam a se fundir, é que o maravilhoso mistério de ser se desvela. Sim, quando os ventos sopram sobre a face enrugada e fazem os poucos fios de cabelos brancos se agitarem sobre olhos esmaecidos, quando o solo clama pela alma e chama o corpo para repousar na cama eterna, o homem percebe que existir é mais que viver, é ser e sentir, é encontrar o sentido que há em morrer para, finalmente, poder nascer...

Carlos Moreira 

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