“Chove lá fora e aqui faz tanto frio.
Me dá vontade de saber... Aonde está você, me telefona.
Me chama, me chama, me chama...”
Lobão (músico e compositor)
Solidão é coisa doída. Dói na alma de quem sente como ferro sendo encravado na carne. E me veio a doideira: “Sentiria Deus solidão? Saudade? Melancolia? Essas coisas de gente dor de cotovelo, de consciência, de coração?”.
Sei não. Papo para teólogo, filósofo, da moçada que procura mistérios, que está mais interessada nas perguntas do que nas respostas.
Mas, no “Paraíso”, aberta a consciência de Adão e Eva, degustado o fruto da “árvore do bem e do mal”, descobertas as percepções do ser, o mundo já não era apenas feito de lírios e rosas, pois lá também estavam os cardos e abrolhos.
Sim, perdeu-se a inocência do amor desprovido de reclames, de compensações, de trocas, tudo ficou triste, frio, feio...
Aí Adão cantou: “Tá tudo cinza sem você, tá tão vazio, e a tarde fica sem porquês...”.
Mas foi Deus quem disse “aonde está você?”. A fala de Adão era pura amargura de alma, comiseração de “escolhido” caído, choramingo de neném abandonado.
Falta mesmo, saudade que doeu no peito, sentiu Deus, pois naquela tarde, daquele dia, o “encontro de sempre” foi diferente. Sim, foi diferente, e dali para a frente, jamais foi o mesmo.
“Aonde está você?”, diz o texto de Gênesis 3. “Me telefona. Me chama, me chama, me chama...”. Mas Adão estava surtado com as demandas da “queda”, buscava um jeito de pôr a culpa em alguém e já começara a construir as teologias da terra...
Era necessário, todavia, pôr tudo aquilo de volta no “Caminho”. Aí, a letra se fez verbo, o verbo ser fez carne, a carne se fez sangue, o sangue se fez vida, a vida produziu semente e a semente se espalhou pela terra.
Sim, por conta de tudo isso, não só o entardecer ganhou nova significação no coração humano, mas todo dia, toda hora, todo lugar, uma vez que “o vento sopra onde quer”.
À noite, quando deitei na minha cama, e as lágrimas rolaram pelo rosto, vi todos os meus dias diante dos meus olhos. Ao fundo, havia uma enorme retroescavadeira tentando me esmagar entre duas lâminas frias de aço.
Meus ossos estalavam e eu dizia com voz sôfrega: “Pare”. Mas mesmo todas as minhas forças contra ela eram nada.
Foi quando os castelos ruíram, os sonhos se partiram, e eu fiquei catatônico, olhando o teto esbranquiçado do quarto qual lousa de escola em primeiro dia de aula, onde tudo ainda está por se fazer.
Naquele instante, creia-me, me deu uma vontade louca de gritar: “Aonde está você?”. Era como se tudo fosse apenas nada...
A essa altura, eu já sei que por vezes o mundo fica cinzento, e a chuva cai nas ribanceiras da alma, alaga os córregos do coração, sufoca a fala, e até os pensamentos.
É que quando “Ele” sai de cena, a vida fica sem porquês... Eis a grande tragédia humana: o dia da indisponibilidade de Deus, o dia em que o telefone está ocupado, e você fica apenas repetindo: “Aonde está você?”...
Carlos Moreira
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