“Os apóstolos reuniram-se a Jesus e lhe relataram tudo o que tinham feito e ensinado. Havia muita gente indo e vindo, ao ponto de eles não terem tempo para comer. Jesus lhes disse: “Venham comigo para um lugar deserto e descansem um pouco”. Mc. 6:30-31
Os discípulos haviam acabado de chegar da “cruzada evangelística” que o Senhor os encomendara. Na missão que lhes foi conferida, constavam instruções para curar enfermos, expulsar demônios, fazer o bem e anunciar a salvação. O sucesso foi retumbante! A “trupe” estava maravilhada com o poder que havia no Nome de Jesus – “até os demônios se submeteram as nossas ordens”. Ao ouvir isto, entretanto, Jesus os trouxe de volta a realidade: “não se impressionem com essas coisas, mas com o fato do nome de vocês está escrito no Livro da Vida”.
A “moçada”, por outro lado, estava empolgada: “de novo!”. Queriam sair aos quatro cantos da terra para realizar a obra de propagação do Reino de Deus. Aqueles dias haviam sido intensos e inesquecíveis. Conforme o texto, nem mesmo tempo para comer eles tiveram. E era de se imaginar... Quem iria se preocupar com comida numa situação daquelas? Comer, dormir, descansar, ter lazer, orar, meditar, parecem coisas supérfluas quando estamos engajados em fazer a “obra”. Creio que, se dependesse dos discípulos, eles sairiam imediatamente para recomeçar tudo novamente. Jesus, entretanto, e de forma surpreendente, pensava diferente...
“Venham comigo para um lugar deserto e descansem um pouco”. O que tinha de ser feito já havia sido feito. Agora era à hora de descansar, de refletir, de orar. Era preciso se preparar física, emocional e espiritualmente para os novos desafios que viriam. O corpo precisava de descanso, a alma de silêncio e o espírito de quietude, pois, até mesmo a obra do sagrado, quando vira rotina, torna-se algo enfadonho e dessignificado.
Vejo os líderes de nossos dias... A grande maioria está assoberbada de atividades, inclusive eu. É a “obra”! Culto de manhã, reunião de tarde, vigília de noite. Programa de rádio, aconselhamento, congresso, discipulado, encontro doutrinário, reunião do conselho, viagem missionária, entrevista para revista, atualização do blog, resposta de e-mail, projeto de ação social, encontro com a juventude, visita ao hospital, ação evangelística, e a lista não termina nunca... É que estamos fazendo a “obra”! Mas, que obra? A obra de quem? A de Jesus? A da Igreja? A nossa própria?...
Eis aí está o grande dilema dos líderes cristãos de nossos dias: ser ou fazer – a grande questão! Agendas intermináveis, compromissos infindáveis; esse é o nosso “negócio”! Não temos família, não temos lazer, não saímos para namorar com nossas esposas, não vamos ao parque com nossos filhos, não nos juntamos com os amigos para dar risada, não vamos ao cinema, ou a um barzinho – credo! –, ou a um teatro; nada! Temos de fazer a “obra”! E a fazemos; se não a de Jesus, certamente a nossa... Não temos tempo para ser porque tudo o que temos está sendo gasto com o fazer. Então vamos fazendo sem ser e, por conta disto, vamos sendo tudo aquilo que não se deve fazer. Tristemente falta-nos a leveza de pés formosos para anunciar, no solo empoeirado da existência de cada dia, a misericórdia e a graça da salvação.
Juntei essas coisas e fiquei pensando: “o que sobra da “obra”? Meu ministério está se tornando uma maratona ensandecida? Para fazer com que ele “aconteça” vou ter que escangalhar minha família, destruir minha saúde, perder os meus amigos, arrasar a minha alma? Aliás, eu creio que tenho alma? Ou imagino que sou de aço, e não de osso? O que sei é que não quero mais “pagar esta conta!”. Chega! Não foi para isto que Jesus me alcançou! Estou certo de que, mesmo Pregadores do Evangelho podem perder a sua alma! Para tal, basta transformarem a dita “obra” em algo que tem um fim em si mesmo. Com lágrimas nos olhos lembro-me da velha canção: “é Meu, somente Meu, todo trabalho. E o teu trabalho é descansar em Mim”...
Digo tudo isto porque tenho andado preocupado. Fico pensando se, naquele último dia, quando estiver diante de Jesus, Ele me falar: “servo mau! Por que fizeste a tua “obra” ao invés da Minha? Te afadigastes com tantas tarefas que te esquecestes de ser quem Eu desejava que você fosse. Sua agenda estava sempre tão cheia que Eu não tinha tempo para falar com você. Tantas coisas queria ter Lhe ensinado! Tanto gostaria de ter feito em você para, em seguida, fazer por seu intermédio! Mas você corria de um lado para o outro. Estava sempre muito atarefado com a “obra”, por isso, perdeu a grande chance de que Eu fizesse a Minha obra em você”...
Sola Gratia!
Carlos Moreira
Perseverança
Há 6 dias
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